O ensino bíblico a respeito do pecado apresenta nitidamente dupla face: a depravação abissal da humanidade e a sobrepujante glória de Deus. A sombra do pecado está sobre cada aspecto da existência humana. Fora de nós, o pecado é um inimigo que seduz; por dentro, compele-nos ao mal, como parte de nossa natureza caída.
Nesta vida, o pecado é intimamente conhecido,
ainda que permaneça estranho e misterioso. Promete a liberdade, mas escraviza,
produzindo desejos que não podem ser satisfeitos. Quanto mais nos debatemos
para escapar ao seu domínio, tanto mais inextricavelmente nos enlaça.
Compreender o pecado nos ajuda no conhecimento de Deus, porém o pecado distorce
até mesmo nosso conhecimento do próprio-eu. Mas se a luz da iluminação divina
consegue penetrar essas trevas, e não somente as trevas mas também a própria luz,
então poderão ser melhor analisadas. Percebe-se a importância prática do estudo
do pecado na sua gravidade.
O pecado é contra Deus. Afeta a totalidade da
criação, inclusive a humanidade. Até mesmo o menor dos pecados pode provocar o
juízo eterno. E o remédio para o pecado é nada menos que a morte de Cristo na
cruz. Os resultados do pecado abrangem todo o terror do sofrimento e da morte.
Finalmente, as trevas do pecado demonstram – num contraste nítido e terrível -
a glória de Deus. A importância prática do estudo da natureza do pecado também
pode ser percebida no seu relacionamento com outras doutrinas.
O pecado distorce todos os conhecimentos e
lança dúvidas sobre eles. Ao defendermos a fé cristã, defrontamos com um dilema
ético: como pode existir o mal no mundo governado por um Deus onipotente e
inteiramente bom? O estudo da natureza divina deve considerar o controle
providencial de Deus sobre um mundo amaldiçoado pelo pecado. O estudo do
Universo deve descrevê-lo como tendo sido criado bom, mas que agora geme,
ansiando pela redenção. O estudo da humanidade deve considerar a natureza
humana, que se tornou grotescamente desumana e desnaturada.
A doutrina de Cristo depara-se com a pergunta
de como a natureza plenamente humana do Filho de Deus, nascido de uma virgem,
pode ser totalmente impecável. O estudo da salvação deve declarar não somente
para qual destino a humanidade é salva, mas também de qual destino foi
resgatada.
A doutrina do Espírito Santo deve considerar a
convicção e a santificação, levando em conta a carne pecaminosa. A doutrina
eclesiástica deve adaptar seu ministério a essa humanidade distorcida pelo
pecado, dentro e fora da Igreja. O estudo dos tempos do fim precisa descrever,
e também defender, o juízo divino contra os pecadores ao mesmo tempo em que
aponta o fim do pecado. Finalmente, cabe à teologia praticar, evangelizar,
aconselhar, educar, governar a Igreja, influir na sociedade e encorajar a
santidade a despeito do pecado. O estudo do pecado, entretanto, apresenta
muitas dificuldades. É revoltante, pois focaliza a fealdade grosseira do pecado
generalizado e flagrante e o logro sutil do secreto e pessoal.
A sociedade pós-cristã de hoje reduz o pecado a
sentimentos ou atos, desconhecendo ou rejeitando totalmente o mal. Mais
insidiosamente, o estudo do pecado é frustrado pelo próprio mal, uma vez que
este é irracional por natureza. O número de conceitos extrabíblicos é imenso.
A despeito de não serem bíblicos, estudá-los é
importante porque nos permite:
• Pensar mais clara e biblicamente a respeito
do Cristianismo;
• Defender melhor a fé e elaborar uma crítica
mais correta dos outros sistemas; • Avaliar mais criticamente as novidades em
psicoterapias, programas políticos, abordagens educacionais, e assim por
diante;
• Ministrar de modo mais eficaz aos crentes e
não-crentes que mantêm essas e outras idéias antibíblicas.
Muitas teorias, tomando como ponto de partida o
existencialismo de Soren Kierkegaard, argumentam que os seres humanos enfrentam
um dilema quando suas limitadas capacidades são inadequadas para satisfazer as
possibilidades e escolhas virtualmente limitadas de suas percepções e
imaginações. Tal situação produz tensão, ansiedade.
O pecado é a tentativa fútil de se resolver à
tensão, através de meios inapropriados, ao invés de aceitá-la de modo
pessimista ou, no modo cristão de pensar, voltar-se para Deus. Num
desdobramento mais radical, argumenta-se que a existência individual é um
estado pecaminoso porque as pessoas estão alienadas da base da realidade
(freqüentemente definida como “deus”) e umas das outras, mutuamente. Esse tema
já aparece em forma primitiva com o filósofo judaico Filo.
Atualmente, expressam[1]no
teólogos liberais, como Paul Tillich, muitas das religiões orientais e o
pensamento da Nova Era. Alguns acreditam que o pecado e o mal não sejam reais,
porém meras ilusões que podem ser vencidas pela percepção correta. A Ciência
Cristã, o hinduísmo, o budismo, o pensamento positivo de alguns tipos de
cristianismo popular, boa parte da psicologia e aspectos do movimento da Nova
Era ressoam essa teoria.
O pecado também tem sido interpretado em termos
dos restos não envolvidos de características animais primevas, como a agressão.
Os defensores dessa idéia dizem que a história do Éden é realmente um mito a
respeito do desenvolvimento da consciência moral, e não uma queda. A teologia
da libertação entende que o pecado é a opressão de um grupo da sociedade por
outro.
Os teólogos da libertação freqüentemente
combinam as teorias econômicas de Karl Marx (que falam da luta entre as
classes, em que o proletariado acabará vencendo a burguesia) com temas bíblicos
(tais como a vitória de Israel contra a escravidão) e também identificam os
oprimidos pelo emprego de termos econômicos, raciais, de distinção entre os
sexos e outros. O pecado é eliminado pela remoção das condições sociais que
provocam a opressão. Os extremistas propõem a derrubada violenta dos opressores
irredimíveis, ao passo que os moderados enfatizam a mudança através da ação
social e da educação. Entre os mais antigos conceitos de pecado está o
dualismo, a crença de que há uma luta entre forças preexistentes iguais
(virtual ou realmente) - os deuses do bem e do mal.
As duas forças cósmicas, com sua luta, são a causa da pecaminosidade na esfera temporal. Muitas vezes, a matéria má (especialmente a carne) ou contém ou realmente é pecado, que deve ser conquistado. Essa idéia aparece nas religiões do Oriente Próximo antigo, como o gnosticismo, o maniqueísmo e o zoroastrismo. Em muitas versões do hinduísmo e do budismo bem como na sua descendente, a Nova Era, o mal é reduzido a uma necessidade amoral. A teologia moderna vê “deus” como finito ou até mesmo em evolução moral. E o mundo sofrerá males enquanto o lado escuro da natureza divina não for controlado, idéia típica da mistura que a teologia do processo faz com a física e o misticismo oriental.
Grande parte do pensamento popular, o
cristianismo desinformado, o iSl amismo e muitos sistemas moralistas sustentam
que o pecado consiste somente em ações deliberadas. Pessoas moralmente livres
simplesmente fazem escolhas livres. Não existe a natureza pecaminosa, apenas
eventos reais do pecado.
A salvação é simplesmente comportar-se melhor e
praticar o bem. O ateísmo sustenta que o mal é meramente uma probabilidade de
um cosmos sem Deus. O pecado é rejeitado, a ética é apenas questão de
preferência, e a salvação, mera autopromoção humanística.
Embora muitas dessas teorias pareçam conter
algum discernimento, nenhuma delas aceita a Bíblia como revelação plenamente
inspirada. As Escrituras ensinam que o pecado é real e pessoal; que se originou
na queda de Satanás, um ser pessoal, maligno e ativo; e que, através da queda
de Adão, propagou-se entre a humanidade, que fora criada boa por um Deus
totalmente bom.
Nenhum comentário:
Postar um comentário